A batalha de Kursk

A Batalha que ocorreu entre 5 de julho e 23 de agosto de 1943, foi um ataque malsucedido da Alemanha às forças soviéticas em torno da cidade de Kursk, no oeste da Rússia.

Foi uma das batalhas mais significantes na Frente Oeste da guerra, pois foi a última ofensiva da Alemanha à esta Frente e a maior batalha de blindados que o mundo já viu. Embora os Alemães tivessem planejado e iniciado uma ofensiva, a defesa Soviética conseguiu com sucesso lançar uma contraofensiva e parar as suas ambições.

Esse confronto era uma tentativa de revanche alemã após a derrota na Batalha de Stalingrado e foi codificada como Operação Citadel.

O general alemão Friedrich von Mellenthin inclusive declarou na época:

“Nenhuma ofensiva foi preparada tão cuidadosamente quanto esta”

O desfecho, porém, contrariou completamente as expectativas do exército nazista. Com a vitória estratégica da URSS, as potências do eixo perderam a habilidade de iniciar operações ofensivas e o exército vermelho ganhou uma enorme vantagem sobre a Wehrmacht.

O Exército Alemão confiava em forças blindadas para avançar rapidamente através das linhas inimigas (a famosa Blitzkrieg). Isto significa que apenas podiam avançar com a ofensiva durante o verão, quanto o clima continental Russo tivesse secado a terra suficientemente para dar aos tanques uma maior mobilidade. A Frente Oeste em 1941 e 1942 tinha se desenvolvido numa série de avanços Alemães durante o verão, seguidos de contra-ataques Soviéticos no inverno.

No inverno de 1942/1943, os Soviéticos conclusivamente ganharam a Batalha de Stalingrado. Um exército completo tinha sido perdido, juntamente com cerca de 500.000 Alemães e Aliados, gravemente esgotando as forças do Eixo no Oeste. Com a iminente invasão Aliada da Europa, Hitler percebeu-se que uma derrota dos Soviéticos antes da chegada dos Aliados Ocidentais se tinha tornado improvável, decidindo forçar os soviéticos a um impasse.

Durante a temporada de chuvas de primavera, ambos os lados estavam exaustos e pararam para recuperar e esperar pela temporada seca, cada um deles preparando novos planos. O palco estava preparado para um combate de titãs, com o desenrolar de três operações planejadas em simultâneo, a Operação Cidadela Alemã e as Operações Polkovodets Rumyantsev e Kutuzov Soviéticas, com a Operação Cidadela efetuando um ataque em pinça com forças de tanques no norte e no sul do saliente, procurando abrir um buraco nas linhas Soviéticas e parando o seu avanço geral.

Em 1917, os Alemães tinha construído a famosa linha Hindenburg na Frente Oeste, diminuindo as suas linhas e por sua vez a sua força defensiva. Planejaram repetir esta estratégia na Rússia e começaram a construir em massa uma série de defesas conhecidas como a linha Panther-Wotan. Pretendiam retirar para a linha em finais de 1943 e prosseguir a causar danos nas forças soviéticas enquanto as suas próprias forças recuperavam.

A fevereiro e março de 1943, Erich von Manstein tinha completado uma ofensiva durante a Segunda Batalha de Kharkov, deixando a linha dianteira funcionando aproximadamente de Leningrado a norte de Rostov.

Com pouca infantaria e artilharia, o exército Alemão foi forçado a confiar primeiramente em seus tanques, e apesar do fato de a ofensiva ter de ser lançada rapidamente, para ter alguma esperança de sucesso, ela foi adiada até que novos tanques Panther e Tiger pudessem ser transportados para a linha da frente de forma a reforçar o ataque. Mesmo com estas novas armas, o comando Alemão não estava certo que o ataque fosse bem sucedido.

Na primeira fase, o inimigo, agrupando suas melhores forças —incluindo cerca de 15 divisões de tanques e com o apoio de um grande número de aeronaves — irá atacar Kursk com as forças agrupadas em Kromskom-Orel do nordeste e com as forças agrupadas em Belgorod-Kharkov do sudeste… Eu não considero aconselhável a nossas forças tomar a ofensiva no futuro próximo de forma a travar o inimigo. Seria melhor fazer o inimigo se desgastar contra nossas defesas, e eliminar seus tanques e então, trazendo reservas frescas, entrar numa ofensiva geral que permitiria finalmente eliminar suas forças principais.

— Comandante Supremo Adjunto Soviético Georgiy Zhukov

Planos alemães

Von Manstein pressionou para uma nova ofensiva baseada na mesma linha bem sucedida que tinha acabado de perseguir em Kharkov, quando cortou fora uma ofensiva soviética demasiado estendida. Sugeriu enganar os soviéticos em um ataque no sul de encontro desesperadamente ao 6º Exército, que se estava a reformar, conduzindo-os à Ucrânia ocidental. Ele poderia então retornar ao sul de Kharkov, enquanto ele abortava uma muito expandida ofensiva soviética.

A captura de um engenheiro de combate Alemão por uma patrulha Soviética na noite de 4 de Julho revelou que os Alemães iriam atacar às primeiras horas da manhã de 5 de Julho.

No papel, as forças Alemãs eram temíveis: tanques Tiger, testados em batalha, seguidos pelos novos Panther e os canhões de assalto Ferdinand; no entanto, enquanto as forças blindadas e de tanques estavam equilibradas, os Soviéticos aprenderam as lições de suas derrotas iniciais e conseguiram integrar infantaria e apoio de artilharia numa doutrina eficiente de armas combinadas.

Cerca de uma hora antes da hora marcada para o início do ataque Alemão, o General Soviético Rokossovsky ordenou um bombardeamento das linhas Alemãs bem como das áreas de preparação, apanhando o inimigo desprevenido, e acabando com a surpresa do ataque. Debatendo-se para responder, os Panzers avançaram sobre as linhas Soviéticas, e muitos dos novos Panthers pegaram fogo sem serem atingidos. Apesar disto, os Alemães conseguiram uma penetração de cerca de 5 quilômetros contra uma forte defesa Soviética.

Foi aqui, no entanto, que o avanço foi paralisado por campos de minas, aviões e infantaria determinada que enfrentaram seus oponentes Alemães. A frente se tornou estática, e ambos os lados se entrincheiraram, esperando pela vantagem até que o General Alemão Hoth planejou um rompimento das linhas Soviéticas, evitando a maioria das defesas Soviéticas e flanqueando até Prokhorovka, um ponto chave onde as reservas Soviéticas podiam desembarcar por trem.

Evitando um ataque preventivo de aeronaves Soviéticas através do uso bem sucedido de posições de radar, a Luftwaffe foi capaz de decolar e atacar as forças aéreas Soviéticas com sucesso, com as aeronaves de ataque ao solo alemãs infligindo pesadas perdas a uma coluna de tanques T-34. O ataque terrestre estava se desenrolando enquanto os pressionados Soviéticos tentavam resistir.

Repentinamente, a notícia chegou da retaguarda que o 5° Exército da Guarda, que tinha se deslocado de noite para evitar a detecção, tinha chegado. Em 12 de julho de 1943, cerca de 700 tanques Alemães (Panzer IIIs, IVs, Tigers e caça-tanques) encontraram cerca de 800 tanques Soviéticos, principalmente T-34s, alguns T-70s e cerca de trinta Churchills que avançaram para combater, carregando paraquedistas da 9ª Divisão Aerotransportada da Guarda.

Tanques e aviões combateram sobre o campo de batalha fumarento por oito horas até que finalmente os Soviéticos conseguiram tomar posse do campo de batalha.

“Foi apenas nessa hora que nós verdadeiramente percebemos a força dos Russos. Antes não queríamos acreditar, mas agora a visão pessimista era de a guerra estava perdida – tudo estava terminado”

— Alfred Rubbel, 503° Batalhão de Tanques Pesados do Exército Alemão

Apesar de novas armas como os tanques Panther ou Tiger, a ofensiva Alemã foi frustrada e eles foram forçados a enviar muitos dos blindados sobreviventes para a Itália, dado que as forças Aliadas tinham acabado de desembarcar na Sicília. Depois de uma das maiores batalhas de blindados da história, o Exército Vermelho agora tinha a iniciativa estratégica na Frente Leste até ao final da guerra na Europa.

Tanque Alemão destruído na batalha de Kursk, 1943.

Forças e Baixas

Os Aliados contavam com uma força de 1.300.000 homens e cerca de 6.500 tanques, enquanto o Eixo possuía cerca de 500.000 homens e 1.500 tanques. As baixas da URSS foram de 177.847 mortos, 600.000 feridos, cerca de 1.500 tanques destruídos e 1000 aviões perdidos, já a Alemanha teve cerca de 56.000 mortos, cerca de 300 tanques destruídos e 200 aviões perdidos. Foi a batalha com o maior custo de perdas aéreas em um só dia na história da guerra.

Artigo: Kursk – Análise do Prelúdio do Fim

De Francisco Almada Ibiapina Camelo

Se em 1941, às portas de Moscou os alemães foram contidos pela primeira vez, se em 1942, em Stalingrado a maré da guerra marcou o começo da derrota do nazismo , entre 04 e 14 de julho de 1943,a a batalha de Kursk, saliente de Stálin entre as cidades russas capturadas pelos alemães de Orel e Kharkov, marcou a virada definitiva da guerra em favor dos Aliados e a parte de iniciativa da Alemanha que passou a defensiva, depois de sofrer perdas enormes justamente onde era mais sensível sua superioridade: a elite militar que comandava as divisões Panzers (já que seus novos tanques Mark V e VI se igualavam aos soviéticos e na perspectiva alemã, os superavam – até encontrarem pela frente na batalha de Kursk os t-34 e KV modelo 85 ou os monstros com canhões navais da série SU 152 – que se revelaram inimigos à altura), iriam compensar a redução do número de veículos nas divisões Panzer de 320 tanques em 1942 para 150 tanques e canhões de assalto (tank destroyer) em 1943, excelentes armas defensivas, mas não de ofensiva, de ruptura.

Uma necessidade alemã de superar suas perdas levaram a adoção deste modelo de veículo blindado, de mais fácil fabricação, mas com canhão de deriva limitada. Os alemães nunca alcançaram a produção russa em números, compensavam esta deficiência com planos meticulosos, extremamente agressivos, que roubavam a iniciativa dos russos, causando-lhes grandes baixas pela surpresa e força dos ataques planejados. Essa era a expectativa em Kursk: Um gigantesco movimento de pinças (ao norte executado pelo 9º Exército do General Model e ao Sul pelo mais forte 4º Exército do General Manstein), que cercaria o saliente e destruiria boa parte do equipamento soviético recém-produzido.

Os soviéticos mostraram também durante a batalha que haviam tropas soviéticas tão boas quanto as superespecializadas panzergranadiers ou os Waffen-SS, como os fuzileiros navais soviéticos ou as tropas de guardas, usadas para destruir os canhões de assalto superpesados alemães Ferdinando, que avançavam sem infantaria, separada daqueles pelo mortífero fogo dos obuses, canhões e metralhadoras dos ninhos russos, numa incrível concentração de 20 mil canhões por 2,5km², fora as minas antitanques; 1,7 mil minas anti-carro por km² (400 mil ao todo), à frente de 5 000 km de trincheiras em uma área total de 65 mil km². Minas estas que chegaram a destruir cem tanques alemães no 1º dia a Operação Cidadela, em uma das cunhas de avanço (ainda que os alemães usassem do expediente de lançarem um “tapete” de bombas para “limpar” os campos minados e avançassem em formato de cunha, com os mais pesados e blindados á frente e em ziguezague para dificultar o tiro dos canhões antitanques agrupados em grupos, os chamados Pakfront).

A derrota alemã na batalha de Prokhorovka, que envolveu 1.200 tanques de ambos os contendores, com destruição de quase 2/3 deles, apesar das maiores perdas terem sido russas, e que começou no dia 12 de julho e só acabou em 13 de julho marcou o fim da Operação Barbarossa: os soviéticos haviam reunido uma quantidade muito maior de equipamento que os alemães mais pessimistas previram. Os mais de mil tanques perdidos pelos alemães, sendo mais de 300 em um único dia em Prokhorovka (com as perdas em outros setores no mesmo dia somadas a este equivalendo a um mês de produção do 3º Reich), inclusive os de nova geração, como os Panther e Tiger só foram mais lamentados que as perdas das suas tripulações, experientes e de certa forma, insubstituíveis. O urso russo tinha muito mais gordura a queimar que a águia alemã. Sua coragem em Prokhorovka, quando lançaram seus t-34 em uma carga suicida contra os Tiger e Panther, para atirar à queima-roupa ou simplesmente arremessando o tanque contra o inimigo, destruindo à ambos, é digno de nota.

Kursk foi um ataque massivo, mas que não tinha o elemento vital de uma arma característica que era a divisão Panzer: mobilidade e surpresa. A imensa batalha de atrito de Kursk desgastou esta arma, que enfrentando um inimigo fortemente entrincheirado, com armamento tão moderno quanto o seu e coragem ímpar e aceitando grandes perdas, pois sabia que o inimigo não podia se dar a este luxo, tendo sua deficiência em treinamento compensado pelo verdadeiro combate blindado “corpo-a-corpo” , onde muitas vezes o choque direto e o atrito tiraram a mobilidade de corpo dos verdadeiros “punhos” de aço alemães, se viram envolvidos nesse verdadeira Batalha de atrito, onde venceu quem tinha mais cartas para jogar no sorvedouro de almas e de aço que se transformou essa batalha.

Os alemães jogaram um “tudo ou nada”, na esperança de com a batalha incapacitar os russos à tempo de repelir uma invasão a Oeste e assim voltar-se para a conquista definitiva do Lebesraüm a posteriori. Não podemos nos esquecer dos combates travados nos céus, onde o IL-2 Sturmovik mostrou ser em muito superior aos JU “Stuka” modificados para função antitanque e tanto no ar quanto em terra o equilíbrio estratégico se manteve, apesar do fracasso inicial russo durante a Batalha, quando lançaram um ataque preventivo contra os alemães, só para serem interceptados durante o caminho e sofrerem pesadas baixas, sem alcançar um único aeródromo alemão, levantando assim o moral destes logo no início da Batalha, onde concentraram durante o período crítico, 40% de seu poderio aéreo na Europa. No ar, os caças PE-2 russos se revelaram tão bons quanto os Focke-Wulf alemães, tendo havido tanto equilíbrio em terra quanto no ar.

Assim, quando contabilizaram as perdas, viram que o golpe não incapacitara os russos e que suas perdas não puderam ser repostas, como fora possível em Moscou ou Stalingrado, ficando sem uma reserva operacional que permitisse cobrir uma retirada escalonada ou fazer pequenos contra ataques locais que sangrassem o inimigo e estabilizassem a frente. A campanha de verão russa desencadeada em todas as frentes (Operação Rumyantsev) separou os Exércitos Alemães Centro e Sul e levou ao desmoronamento da defesa alemã, que já não conseguia reunir tropas e equipamentos suficientes para estabilizar uma frente enquanto a outra se virava sozinha, aguardando o socorro, ou seja, perdeu a flexibilidade estratégica.

Orel, Belgorod, Kharkov, Kiev e Península da Criméia foram perdidas para os russos, que reconquistaram até o fim do ano 2/3 das áreas do país ocupadas pelos alemães, avançando em linha reta 350-600 km, mostrando que os generais soviéticos haviam se igualado aos seus colegas alemães. O embate gigantesco que envolveu mais de dois milhões de homens, trinta mil canhões, mais de seis mil tanques e cinco mil aviões somados de ambos os lados, revelou a capacidade de defesa estática soviética, sua capacidade de suportar perdas, maiores que a do inimigo, desde que resguardado por potencial humano e industrial superior para tomar a ofensiva após o desgaste da batalha. Os 800 mil mortos e feridos soviéticos foram perdas aceitáveis para os 500 mil mortos e feridos alemães, que nunca conseguiram substituir. O argumento que o espião Lucy salvou os soviéticos não se sustenta, pois os longos preparativos alemães permitiriam a qualquer Estado-Maior prever a direção do deslocamento inimigo e não passa de argumento da Guerra Fria para desmerecer o esforço de guerra soviético, pois grandes planos pressupõe que o inimigo vai cometer ações que esperamos, e não as reais, que envolvem elementos inesperados, como a surpresa, o imponderável, etc.

* Francisco Almada Ibiapina Camelo é formado em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

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