Agentes secretos britânicos planejaram assassinar Adolf Hitler nos últimos meses da 2ª Guerra Mundial, depois de colher informações secretas extraordinariamente detalhadas sobre seus hábitos pessoais e obter o croqui de seu refúgio nos Alpes, revelam documentos divulgados em julho de 1998.
Os documentos mostram que agentes da SOE – Agência de Operações Especiais – decidiram entrar clandestinamente por trás das linhas inimigas e traçaram planos elaborados, que receberam o codinome “Operação Foxley”, para matar Hitler com uma arma de fogo disparada por um franco-atirador, no seu retiro, por meio de um ataque ao seu trem especial ou envenenando o seu chá. Os planos são expostos em centenas de documentos sobre as atividades da SOE, mantidos em sigilo até recentemente, e agora divulgados pelo Departamento de Registros Públicos da Grã-Bretanha. Chama a atenção a ausência de três arquivos sobre as operações daquele organismo na República da Irlanda. Entre os assassinos em potencial que a SOE pensou em utilizar incluíam-se trabalhadores estrangeiros empregados no retiro de Hitler em Berchtesgarten, nos Alpes bávaros. Um oficial da SOE chegou a pensar em hipnotizar Rudolf Hess e fazê-lo executar a tarefa. Hess, ex-representante de Hitler, foi para a Grã-Bretanha em 1941, numa aparente tentativa de convencê-la a fazer as pazes com a Alemanha.
As sementes do plano de liquidar Hitler – aprovado por Anthony Eden, secretário das Relações Exteriores, na época – foram lançadas por um coronel francês, que descobriu, em junho de 1944, que Hitler estava alojado em um chateau situado perto de Perpignan, no sudoeste da França. O coronel sugeriu ao pessoal da SOE que operava com as Forças Livres francesas na Argélia que os aliados deveriam bombardear o chateau. Embora aquela oportunidade tenha sido perdida, agentes da SOE na Argélia exortaram Londres a adotar a ideia. O general Hastings Ismay, secretário do Gabinete de Guerra, disse a Churchill que os chefes do Estado-Maior eram unânimes quanto à ideia de que, “do ponto de vista estritamente militar, seria quase uma vantagem se Hitler permanecesse no controle da estratégia alemã, tendo-se em conta os erros que ele havia cometido, mas, de um ponto de vista mais amplo, quanto mais rapidamente ele fosse afastado, melhor”.
Depois de conversar com o chefe do MI-6, sir Stewart O Menzies – sobre o plano de assassinato, o general de divisão Colin Gubbins, chefe da SOE, disse ao seu pessoal:
“Não posso afirmar que ele se mostrou entusiasmado… Mas eu lhe disse que ficaríamos gratos por qualquer ajuda que pudesse dar para nos manter na pista do cavalheiro.”
Houve oposição firme do major Field-Robertson, chefe da seção alemã do Soe, identificado nos documentos apenas como “X”. Ele advertiu que a morte “canonizaria” Adolf Hitler. E acrescentou:
“Seria desastroso se o mundo viesse a pensar que os aliados precisaram recorrer a esses métodos vis pelo fato de não terem tido meios de derrotar a máquina militar alemã.”
A princípio, os agentes da SOE pensaram em matar Hitler usando armas químicas ou bactérias, de acordo com os documentos. A SOE descreveu uma substância não identificada como a mais adequada, em vista de sua ação retardada. Agentes da SOE ressaltaram:
“Hitler, de acordo com informações fidedignas, é viciado em chá. Ele sempre o toma com leite. Como o leite é derramado antes na xícara, é pouco provável que a opalescência do chá (por causa do veneno) fosse notada, quando este fosse derramado na xícara.”
Um documento da SOE sobre a eliminação de Hitler, de 122 páginas, contém detalhes surpreendentes, fornecidos por informantes, sobre os movimentos de Hitler e o croqui do seu retiro nos Alpes. “Hitler acorda tarde”, diz o documento. “Nunca se levanta antes das 9 ou 10 horas. Em seguida vai tomar a refeição matinal. Ele almoça às 16 horas – só vegetais”. Ele trabalhava até cerca das 22 horas, usualmente com sua amante, Eva Braun. Depois, mantinha uma reunião diária, quando era discutida a situação militar. “À 1 hora ou 1h30 ele ceia, comendo o mesmo que comeu no almoço”, indica o documento. “As 3 ou 4 horas, ou mais tarde, vai dormir.” O documento descreve como os cães da SS que vigiavam o complexo faziam a patrulha e contém desenhos extremamente detalhados das dependências do retiro e do trem de Hitler.
Em março de 1945, a SOE indicou que tinha a intenção de usar o capitão E. H. Bennett, adido militar na embaixada de Washington, como assassino. Mas, um mês depois, o projeto foi abandonado. A SOE foi avisada de que a situação havia mudado e já não se pensava mais em executar o tipo de operação que ele havia preparado.
O plano foi abandonado, pois poderia transformar Hitler em mártir.
Os britânicos abandonaram os planos porque concluíram que, vivo, Hitler levaria a Alemanha à derrota: A trama da Agência de Operações Especiais (SOE, sigla em inglês) para matar Hitler começou quando uma fonte confiável em Argel revelou ao serviço de informações britânico que o ditador alemão estava naquele momento em um chateau em Perpignan, no sul da França e sugeriu que o local fosse bombardeado imediatamente.
Em um memorando enviado em 20 de janeiro de 1944, em que estava escrito “urgentíssimo”, um alto funcionário da SOE disse que a informação tinha sido transmitida por Duff Cooper, que se tornou embaixador em Paris ainda naquele ano. Cooper pediu que a SOE examinasse as possibilidades operacionais e disse que ia conversar com Anthony Eden, o secretário de Relações Exteriores. O memorando terminava assim:
“Nós não, repito, não, estamos loucos e isto não é uma brincadeira”.
Nunca foi dado seguimento a essa informação, fornecida por um coronel francês, que resultou em um dos mais secretos estudos de viabilidade da 2ª Guerra Mundial: seria possível assassinar Hitler?
Na quarta-feira, 28 de junho de 1944, no quarto 312 do Gabinete de Guerra, o general-de-divisão Colin Gubbins, chefe da organização clandestina de sabotagem, estava presidindo uma reunião quando disse que precisavam encontrar o paradeiro de Hitler e depois planejar uma forma de “lidar com ele”. E observou:
“Em algum momento do futuro próximo, de qualquer forma Hitler desaparecerá de cena, mesmo que não sejamos os agentes diretos de sua eliminação; podemos ao menos preparar tal ação para promover seu desaparecimento, pois ela será a melhor contribuição para uma situação mais favorável para os aliados.”
Um dos mais entusiasmados defensores da Operação Foxley era o vice-marechal-do-ar Ritchie, conselheiro de aeronáutica do SOE, que se reunia uma vez por semana. Ele disse que Hitler era considerado “um pouco mais do que humano” por uma grande parcela da população da Alemanha. “Eliminem Hitler e nada restará.”
Um relatório de 120 página detalhava item por item tudo o que se conhecia sobre Hitler: seus movimentos, seus hábitos, seus gostos e antipatias pessoais, o layout preciso do seu esconderijo nos Alpes bávaros, o número de sentinelas que o protegia e se Eva Braun, sua vistosa secretária de 24 anos, estava fazendo sexo com ele. Eles decidiram que naquele estágio era puramente platônico. Para explodir o trem do Führer seria necessário pôr explosivos nos trilhos, em desvios ou na estação de Salzburgo. Uma alternativa era descarrilar o trem atirando uma maleta de explosivos debaixo dele.
De todos os métodos possíveis, a Operação Foxley concluiu que a caminhada de Hitler até a casa de chá era a melhor oportunidade para um ataque de tocaia. Os assassinos estariam usando uniformes das tropas montanhesas alemãs, armados de fuzis Mauser com mira telescópica e carregando granadas altamente explosivas para autoproteção.
A operação exigia a passagem através de uma cerca de arame enquanto se evitava a patrulha dos cães alemães. Surgiram questões sobre o tipo de pessoa que seria escolhida para a missão: ele teria dentes postiços, óculos ou “qualquer peculiaridade física, tal como usar um membro falso”. Enquanto um assassino com uma perna artificial foi considerado algo muito pouco provável, chegou-se a um acordo de que ele deveria usar óculos, mesmo que não quisesse.
O homem escolhido estava trabalhando entre os 6 mil membros do corpo diplomático britânico nos Estados Unidos, embora não fosse dada nenhuma razão para essa escolha. Em 16 de março de 1945, foi enviado um telegrama para Nova York da SOE de Londres com um pedido para sondar o capitão E. H. Bennett, um adido militar da embaixada em Washington, mas sem mencionar a Operação Foxley. A resposta foi encorajadora. “Ele, longe de ficar desencorajado com as minhas indicações das possíveis dificuldades dá atribuição, mostrou-se ainda mais entusiasmado”, dizia o documento. O capitão Bennett disse que “gostaria de conseguir um emprego clandestino permanente” e ficaria feliz em viver na Alemanha depois que a guerra acabasse.
Em 26 de março, porém, um outro telegrama foi enviado para Nova York:
“Nas presentes circunstâncias, não vemos uma boa razão para solicitar a assistência desse funcionário. Poderemos voltar ao assunto mais tarde.”
E em 6 de abril, uma nota do general Gubbins dizia:
“Esse tipo de operação não está sendo considerado agora.”
Embora não haja uma explicação completa, parece que o planejamento para a Operação Foxley esgotou seu tempo. Além do capitão Bennett, não houve outros candidatos para a tarefa e a guerra estava para acabar: Os chefes do Estado Maior tinham estado certos em sua precaução inicial: Hitler vivo estava causando bem mais problemas para o esforço de guerra da Alemanha do que Hitler morto.