Para compreender a complexa mística do fabuloso exército de voluntários estrangeiros que lutou ao lado do Reich durante a guerra é necessário remontar no tempo até à primeira época do partido nazista.
Poucos anos depois da fundação do NSDAP surge a necessidade de criar um corpo de elite, destinado a proteger os chefes nazis nos comícios e concentrações. Por esta razão foram fundadas as SS, as Polícias de Proteção do partido nazista.
O que era a SS
A Schutzstaffel, ou SS, foi uma grande organização paramilitar pertencente ao partido nazista alemão. Seu lema era “Mein Ehre heißt Treue” (Minha honra é a lealdade).
Da Stroßtrupp (“Tropa de Choque”) de Adolf Hitler (400 Sturmabteilung, SA, de elite, criada em 1921 por Ernst Röhm), nasceram em 1925 as SS abreviatura de Schutztaffel, (“Escudo de Proteção”), que em 1932 tinham 60.000 membros, dois anos depois 100.000, 240.000 em 1939 e que, durante a Segunda Guerra, chegaram a um milhão de efetivos.
A partir de 1933, as SS instalam o terror e milhares de judeus, comunistas, homossexuais, ciganos, possíveis opositores, são atirados sem julgamento para campos de concentração. Röhm e o seu grupo, bem como outros adversários sem qualquer ligação com eles, muitos deles imaginários ou por mera vingança pessoal, são mortos a 30 de Junho de 1934 na “Noite das Facas Longas”. O chanceler austríaco Engelbert Dollfuss será mesmo assassinado em Julho desse ano. Com o decurso da guerra, este clima de terror estender-se-á a toda a Europa ocupada.
Os nazistas consideravam a SS como sendo uma unidade de elite, cujos membros eram selecionados segundo critérios raciais e ideológicos. Sua atividade como unidade de combate, chamada Waffen SS, era muitas vezes confundida com a do exército alemão, a Wehrmacht, apesar de as duas organizações terem objetivos bem distintos.. As SS ficaram conhecidos, no entanto, pela sua participação no reforço da política nazista. Tais atos foram principalmente executados por departamentos que compunham o Reichssicherheitshauptamt, como a Gestapo, o Sicherheitsdienst (SD) e o Einsatzgruppen.
Líderes das SS:
- Julius Schreck (1925-1926)
- Joseph Berchtold (1926-1927)
- Erhard Heiden (1927-1929)
- Heinrich Himmler (1929-1945)
- Karl Hanke (1945)
- Cristopher Korczak (1925-1929)
- Reinhard Heydrich (1931-1942)
Num primeiro momento, as SS fazem parte das SA ou Seções de Assalto, organização paramilitar destinada à luta de rua. Mas após a sangrenta noite das facas longas, as SS são reconhecidas como organização independente dentro do partido.
Poder absoluto após a “Noite das Facas Longas”
Nessa altura, Heinrich Himmler, SS-Reichsfuhrer ou chefe nacional das SS, dividiu a sua estrutura em dois grandes ramos: a SS-Allgemeine ou SS-General e a SS-Verfungungstruppe (SS-VT) ou tropas militarizadas SS à disposição. Ambas diferentes.
Enquanto a SS-Allgemeine estava concebida como tropa de reforço policial, a SS-VT era totalmente uma organização militar, e como tal começou a desenvolver-se.
Em Fevereiro de 1933 cria-se a SS-Totenkopfverbande, destinada ao serviço da guarda dos campos de concentração, organizada em cinco batalhões sob o comando do inspector de campos de concentração e general das SS Theodor Eicke. Em Agosto do mesmo ano, Hitler, mediante um decreto ultra-secreto, dispõe que as SS-VT sejam instruídas como organizações militares, com equipamentos fornecidos pela Wehrmacht. Ao mesmo tempo decreta a aceitação de voluntários nórdicos não alemães.
Em 1935, a SS-VT está organizada em dois regimentos: o primeiro, aquartelado em Munique, e o outro, em Hamburgo. À margem, existe o corpo de guarda de Hitler, conhecido como Leibstandarte Adolf Hitler.
Com a anexação da Áustria ao Reich em 1938, Himmler cria outro regimento em Viena, e em Novembro é formado em Dantzig um corpo das SS, integrado por oficiais da Totenkopfverbande.
Estala a guerra: nascem as Waffen SS
Quando a Alemanha atravessa a fronteira polaca, a 1 de setembro de 1939, a SS-VT está organizada em três divisões, um regimento motorizado e catorze regimentos de reforço policial. Também é criada a SS Haupt Amt, departamento de recrutamento das SS, com o general Berger à frente.
Em princípios do ano 1940, Andreas Schmidt, líder da comunidade germânica da Roménia e Transilvânia, propõe a Berger o recrutamento dos volksdeutscher, os alemães étnicos súbditos de países estrangeiros.
Em Março de 1940, Himmler adopta o título oficial de Waffen SS, e o contigente de estrangeiros soma uma centena de homens, entre os quais cinco norte-americanos de origem alemã, três suecos e quarenta e quatro suíços. Mas a invasão da Dinamarca e da Noruega em Abril abre novas possibilidades, e Himmler põe todo o seu empenho em recrutar voluntários escandinavos. A 20 do mesmo mês autoriza a criação do regimento SS-Nordland, com voluntários dos dois países.
A campanha do Oeste abre também novas perspectivas, e a 25 de Maio constitui-se o regimento SS Westland, com voluntários holandeses e flamengos. No Outono, estes dois regimentos, junto com o alemão Germânia, formam a primeira divisão estrangeira das SS, a Divisão SS Wiking, sob o comando do general Steiner ? um dos melhores generais da Waffen SS.
Enquanto isto, na maioria dos países ocupados pelo Reich, surgem, com a invasão da Rússia no ano 1941, diversas legiões de voluntários que dependem da Wehrmacht. Dotadas de maior entusiasmo que efectividade, lutarão na frente do Leste durante todo o ano de 1942, até que são paulatinamente enquadradas na Waffen SS no princípio de 1943. As legiões holandesa e flamenga formam duas brigadas de assalto, a Neederlander e a Langemark, respectivamente. Por outro lado, a dinamarquesa e norueguesa integram o regimento Nordland, posteriormente elevado a divisão em Maio de 1943.
Além dos corpos de voluntários, vários países europeus conheceram a sua própria SS. Tal é o caso dos belgas flamengos, que formam uma Germaansche SS in Vlaandern ou SS germânicas na Flandres. Também a Noruega, com as suas SS Norske, e a Holanda com as Germaansche SS in Neederland, concebem estas forças de reforço policial, à semelhança da sua homónima germânica.
Do racismo ariano ao voluntariado estrangeiro
Em Janeiro de 1942, Hitler decide criar um batalhão de carros blindados nas principais divisões da Waffen SS. Além disso, aceita que se organize um SS Panzergeneralkomando, cuja chefia recai no veterano general Paul Hausser, verdadeiro pai das Waffen SS. Em Novembro , outras quatro divisões recebem dotações de carros suplementares, canhões de assalto e veículos de transporte blindado, passando estas a denominar-se SS Panzergrenadierdivision, mais tarde conhecidas como SS Panzerdivision.
A meados do ano autoriza-se a criação de novas divisões. São a Nord, a Prinz Eugen e a Florian Geyer. Assim, em Agosto, a Waffen SS consegue triplicar os seus efectivos, e criam-se duas novas divisões, a Honenstauffen e a Frundsberg.
Mas as limitações que continuavam a existir para o ingresso de não germânicos na Waffen SS faziam perder numerosos contingentes de possíveis voluntários. Já em 1941, o chefe do recrutamento, Berger, solicitou a Himmler o uso de ucranianos, que foi rejeitado por motivos raciais. Depois de numerosas objeções – também de Hitler -, abrem-se os centros de recrutamento para ucranianos em 1943. A realidade supera largamente todas as previsões: apresentam-se cem mil homens, dos quais são seleccionados trinta mil, formando-se com eles a divisão Galizien.
Também, no princípio do ano de 1943, cria-se uma das divisões mais famosas das Waffen SS, a Hitlerjugend. Arthur Axmann, chefe da Juventude Hitleriana, propõe a Himmler a criação de uma divisão formada por rapazes de dezassete anos, membros da juventude do partido nazi. Himmler fica fascinado com a ideia, mas o ministro da Propaganda Goebbels opões-se ao projecto, referindo as possíveis consequências propagandísticas da medida. Pensava que os Aliados aproveitariam o recrutamento de crianças para denunciar o regime nazi. Contudo, Hitler não só apoia a ideia da formação como também propõe oficiais da sua nova Leibstandarte para comandos da nova divisão.
Formada e treinada na Bélgica, a XII SS-Panzerdivision Hitlerjugend fará o seu baptismo de fogo durante o desembarque da Normandia, tentando travar o avanço dos carros britânicos.
Apesar de terrivelmente destruída, seria reconstituída, participando na ofensiva das Ardenas, durante o Natal de 1944.
Franceses, ingleses e muçulmanos nas SS
Mas, sem dúvida, os voluntários estrangeiros que viveram uma aventura mais dramática foram os franceses. Após ser dissolvida a LVF (Legião de Voluntários Franceses) em Setembro de 1944, e da autorização de Himmler para utilizar gauleses nas Waffen SS, cria-se inicialmente a brigada de assalto de voluntários SS franceses. Instruída por SS holandeses, é enviada para a frente do Leste, onde é praticamente aniquilada. No Outono de 1944 recebe um novo contingente de sete mil trezentos e quarenta homens, que, no regresso da frente, não serão mais de oitocentos. Rebatizada como regimento SS de assalto de voluntários franceses Charlemagne, é enviada para Berlim durante a agonia do Reich. Os seus sobreviventes ficaram prisioneiros do exército do general Leclerc, sendo fuzilados por traição.
No Outono de 1943, os sobreviventes das legiões nórdicas são fundidos numa só unidade, a divisão panzer das SS Nordland. Enviada primeiro contra os partisans da Jugoslávia, ocupou mais tarde um sector da frente de Leninegrado. Na divisão Nordland estava o reduzidíssimo Britisches Freikorps, formado por uma centena de prisioneiros renegados britânicos, que, realmente, funcionava mais como força propagandística que militar. Na frente deste singular grupo estava John Amery, filho do ministro Leopold Amery, do Gabinete de Churchill.
Paradoxalmente, as Waffen SS viveram o seu apogeu durante as últimas fases do conflito. Assim, os anos de 1944 e 1945 foram, sem dúvida, os mais frutuosos quanto a voluntários estrangeiros. No ano de 1944 foram formadas diversas unidades de muçulmanos, como a divisão Handschar, utilizada contra os partisans de Tito. Posteriormente, e como apoio à divisão Prinz Eugen, cria-se outra divisão muçulmana, a Skanderberg, recrutada na Albânia. Estas divisões conservaram os privilégios que tinham no antigo exército austro-húngaro, tais como o uso do fez, rações especiais e, inclusive, imãs integrados nos quadros das divisões.
Quanto ao recrutamento de voluntários russos, o assunto era mais difícil. Considerados racialmente inferiores, o seu uso não era oficial, ainda que se soubesse que muitas unidades combatentes do Leste utilizavam os serviços dos conhecidos hilfswillige, ou voluntários auxiliares soviéticos. Sem dúvida, a inflexível gestão da ocupação alemã dificultou em grande medida uma colaboração que podia ter sido mais espontânea e, portanto, mais efectiva.
Prisioneiros e delinquentes na Rússia
Contudo, o seu trabalho limitou-se, na maioria dos casos, à formação de batalhoões policiais de segurança, muitas vezes mais violentos que os próprios alemães. As unidades de Bronislav Kaminki, fuzilado pelas SS, ou a de Oskar Dirlewanger, eram, na realidade, brigadas disciplinadoras de delinquentes comuns, responsáveis por numerosas desgraças e toda a espécie de crimes.
Mas, sem dúvida, as Waffen SS foram muito mais que um grande grupo de divisões legionárias. A coberto dos caracteres das duplas runas (símbolo da vitória representado por dois sinais semelhantes a dois esses) estavam também os membros da Totenkopfverbande, encarregados da administração dos campos de concentração alemães e responsáveis por milhares de assassinatos.
Uma lenda entre o crime e heroicidade
No fim da guerra, as Waffen SS tinham formado trinta e oito divisões de combate. Durante todo o conflito, mais de um milhão de homens lutaram nelas, representando mais de quarenta nacionalidades. Mais de trezentos mil caíram na frente, entre os quais trinta e dois comandantes de divisões.
O grau de disciplina conseguido por estas tropas de elite só se viu superado pela ferocidade utilizada nos seus assaltos frontais, e continua sendo uma incógnita como uma tropa que fez sua a divisa “A minha honra chama-se fidelidade” pôde ser ao mesmo tempo responsável por atos tão infames.
A Gestapo e a SS
A polícia secreta – Gestapo, era a garantia do completo domínio da população pelo Partido Nazista. Só ela contava com mais de 500.000 homens, e tinha preparado – nos mínimos detalhes – todas as defesas contra uma possível revolução interna. Ninhos de metralhadora disfarçados em pavilhões de pedra, ou de abrigos contra bombardeio destinados ao pessoal, foram instalados nas estações de estrada de ferro e nas encruzilhadas de tráfego das grandes cidades. Soldados das Tropas de Assalto (SS), armados com fuzis automáticos, ocupavam as casas de esquina com importância estratégica.
A Gestapo, na sua incessante caça aos inimigos do partido, empregava processos que deixavam a perder de vista os métodos inquisitoriais da Idade Média. Mantinham uma atmosfera de terror. Só se faziam prisões a altas horas da madrugada; os homens encarregados da captura, propositadamente taciturnos e carrancudos, não ofereciam qualquer explicação aos presos nem às famílias, e a uns e outros se procurava dar a impressão de que o destino imediato do sinistro cortejo – era a forca.
Naqueles casos em que o terror só por si mostrava ser ineficaz, a Gestapo não hesitava em incitar e provocar à rebelião.
Quando os chefes da polícia alemã ouviam dizer que andavam rumores de rebelião em qualquer lugar do país, era freqüente mandarem logo um agitador para organizar uma conspiração. E, uma vez descoberta convenientemente a revolta, lá vinha a Gestapo de surpresa para prender os ingênuos que se deixaram levar no engodo dos provocadores.
Se a execução em massa se tornava oportuna, a tarefa recaía habitualmente nas SS, ou Guardas Negros, assim chamados pela cor dos uniformes que usavam. As brigadas negras tinham servido sobretudo na “limpeza” de judeus, tarefa na qual se conduziram sempre com o máximo da brutalidade, muito embora esta pareça nada, quando comparada com o que os mesmos soldados das SS tinham praticado no Leste europeu, em matéria de repressão e terror. Talvez nunca venha a ser possível apurar exatamente quantas vidas de judeus, poloneses e russos pesavam (se é que pesavam!) sobre a consciência desses soldados enfurecidos que formaram os exércitos do nazismo.
Os homens das SS eram escrupulosamente selecionados para a formação das brigadas de execução no Leste europeu. Recrutavam-se antes de tudo entre os elementos mais brutais da população, e iam sendo gradualmente treinados para se tornarem ainda mais duros e mais implacáveis. Eram em seguida designados para constituir os pelotões de execução de indivíduos isolados; e só depois desse treino progressivo eles estavam em condições de começar a matar gente em massa, tal como tinha sido feito nas frentes do leste.
Apesar de todo esse treino, muitos homens tinham recusado tomar parte nas execuções em massa, sendo recambiados para a Alemanha, sob sérias ameaças de represália na pessoa deles ou de suas famílias, no caso de falarem alguma coisa. Outros sofreram de ataques de loucura, e foram recolhidos a manicômios. Diversas vezes tinham sido chamados médicos para tratar soldados que voltavam de licença à Alemanha, sofrendo de ataques agudos de angústia ou de insônia persistente. A história era sempre a mesma: “Não posso mais aturar aquilo… Não vejo senão sangue nos meus sonhos…”