A participação do Brasil na guerra

A Segunda Guerra Mundial foi um marco na história da civilização moderna. E não foram poucos os países que se mobilizaram para realizar as manobras que levaram à vitória contra o nazi-fascismo. Ao mesmo tempo em que a Alemanha estava se rendendo às forças Aliadas, o Brasil entrou na batalha por intermédio dos Estados Unidos, sendo o único país da América Latina a participar diretamente da guerra.

Vargas entrou na guerra por causa de um ataque submarino à costa brasileira. Como se sabe hoje, houveram 26 ataques de U-Boats que obtiveram sucesso, afundando 25 navios brasileiros e avariando 1. No total, cerca de 845 pessoas morreram devido aos ataques. Sem contar a tentativa frustrada de assassinar o vice-presidente do país.

Bom, na verdade houve somente um ataque onde foram afundados alguns navios mercantis brasileiros, e isso fez o Brasil “assinar” seu nome no livro da guerra. Mas o que fez o Brasil levar seus pracinhas para a Itália foi o pagamento – por parte dos americanos – de uma grande quantia à Vargas. Este pagamento foi realizado porque os Estados Unidos haviam emprestado muito dinheiro para vários países da Europa e, caso esses países virassem para o lado de Hitler, os Estados Unidos não receberiam esse dinheiro de volta. Com medo do não-pagamento dessa dívida, os americanos buscaram aliados onde podiam, nesse caso, no Brasil.

A Força Expedicionária Brasileira (FEB) criada pelo Brasil para participar da Segunda Guerra, foi enviada para o teatro de operações da Itália, onde operou no período de julho 1944 a junho de 1945, com um efetivo total de 25.334 homens. O equipamento era essencialmente de procedência norte-americana, e a quase totalidade foi recebida na Itália onde lutou como parte integrante do 5º Exército Norte-Americano. Invariavelmente, comida e munição dos Estados Unidos chegavam aos montes para os soldados brasileiros.

O Brasil é aquele país onde mesmo durante as comemorações de mais de 75 aniversários da vitória sobre a Alemanha nazista, tem-se a impressão de que tal evento aconteceu há muitos e muitos anos, numa galáxia distante. No exterior, o Brasil não costuma ser lembrado por sua participação na Segunda Guerra Mundial.

Acontece que a Segunda Guerra foi uma coisa prática. Tão prática que o planeta em que vivemos ainda é, em larga medida, moldado pelos acontecimentos de 1939-1945. Depois do conflito que custou 50 milhões de vidas, vieram a Guerra Fria, a criação de Israel e as lutas de libertação nacional.

Nossa participação no conflito foi pequena em termos numéricos. Mais uma vez, porém, a força do símbolo se impõe. O Brasil foi o único país da América do Sul a cerrar fileiras com os Aliados num continente mais que suspeito de simpatizar com o nazi-fascismo. Rompeu relações com a Alemanha em janeiro de 1942 e entrou na guerra em agosto do mesmo ano, quando nada permitia antecipar a derrota de Hitler.

A valente Argentina, por exemplo, declarou guerra à Alemanha em março de 1945. Não havia tempo hábil para mandar tropas à Europa. A guerra alemã, como se sabe, acabou em 08 de maio.

O Brasil não apenas tomou Monte Castello, bombardeou vitais linhas de suprimento do Exército alemão na Itália ou caçou submarinos nazistas no Atlântico Sul: a base aérea de Natal foi a maior que a Força Aérea americana manteve fora dos EUA e a sua Quarta Frota ficou ancorada em Recife em meados de 1943. No comando estava o Almirante Jonas Ingram, que tinha sob sua subordinação, a Fleet Air Wing 16. Marcas desta passagem estão por lá até hoje.

Os aviões da Fleet Air Wing 16 eram:

  1. Esquadra VP-83/VB-107 – Sede Natal; 12 PBY5/ 12 PB4Y; Abr 43 a Jan 45;
  2. Esquadra VP-74 – Sedes Rampa/Aratu; 12 PBM3; Mar 43 a Out 43;
  3. Esquadra VP-94 – Sedes Natal/Belém/Maceió/Salvador; 15 PBY5; Jan 43 a Dez 44;
  4. Esquadra VB-127 – Sedes Natal/Fortaleza Pici; 12 PV1; Mar 43 a Set 43;
  5. Esquadra VB-129 – Sedes Natal/Recife/Salvador; 12 PV1; Jun 43 a Fev 44;
  6. Esquadra VB-130 – Sede Fortaleza Pici; 12 PV1; Ago 43 a Mai 44;
  7. Esquadra VB-143 – Sedes Recife/Salvador; 12 PV1; Ago 43 a Mai 44;
  8. Esquadra VB-145 – Sede Natal; 14 PV1; Set 43 a Jan 45;
  9. Esquadra VB-211 – Sedes Galeão/Aratu/Natal; 12 PBM3; Set 43 a Mai 45;
  10. Esquadra VP-203 – Sedes Aratu/Galeão; 12 PBM3; Out 43 a Mai 45;
  11. Esquadra VB-134 – Sedes Recife/Natal; 14 PV1; Jan 44 a Mar 45;
  12. Esquadra VP-45 – Sedes Belém/Salvador; 15 PBY5; Abr 44 a Mai 45;
  13. Esquadra VPB-126 – Sede Natal; 12 PV1; Jan 45 a Mai 45;
  14. Esquadra VPB-125 – Sede Natal; 12 PV1; Fev 45 a Abr 45.

Decerto Getúlio Vargas não se aliou a Franklin D. Roosevelt por convicção democrática. Pressionado pelo povo, ele foi inteligente para tirar vantagem econômica da guerra. Antes dela, por sinal, era o Terceiro Reich o principal parceiro comercial do Brasil. Foi graças à aliança com os EUA que a Companhia Siderúrgica Nacional pôde ser erguida em Volta Redonda. Foi graças à CSN que, onze anos após a guerra, Juscelino Kubitschek pôde implantar a indústria automobilística nacional, matriz de nosso (sub) desenvolvimento. E foi graças à indústria automobilística nacional que Luiz Inácio da Silva pôde tornar-se Lula. Direta ou indiretamente, portanto, o Brasil moderno nasce da Segunda Guerra.

Até porque, ao mandar nossas tropas para a Europa, Vargas cavou a própria sepultura como ditador. Quando elas retornaram, vitoriosas, o paradoxo ficou evidente: como defender o mundo livre lá fora e viver sob a opressão aqui dentro? Em 1945, Vargas foi apeado do poder; e o país, democratizado. O próprio caudilho pôde voltar pelo voto popular, cinco anos depois. Por tudo isso, celebrar o Dia da Vitória é não apenas honrar os mortos, mas renovar o compromisso com a democracia.

SOLDADOS EFETIVOS:

Chegados com o 1° Escalão5.075
Chegados com o 2° e 3° Escalão10.375
Chegados com o 4° Escalão4.691
Chegados com o 5° Escalão5.082
Por via aérea111
TOTAL25.334

Depósito de pessoal e outros órgãos não divisionários: 10.265

Tropa em ação de combate (1° D.I.E. *): 15.069

* D.I.E. – Divisão de Infantaria Expedicionária

Em 239 dias de ação contínua contra o inimigo (de 06/09/1944 a 02/5/1945), a FEB apresentou os seguintes dados:

PRISIONEIROS CAPTURADOS:

Generais2
Oficiais892
Soldados16.679
TOTAL20.573

BAIXAS BRASILEIRAS:

Mortos:

Oficiais13
Praças430
Oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB)8
TOTAL451

Feridos e acidentados:

Feridos em ação de combate1.577
Acidentados *1.145
TOTAL2.722
* Dos quais, 487 em combate.

Pracinhas feitos prisioneiros:

Oficiais1
Praças34
Não recuperados *23
TOTAL35
* Dos quais, 10 enterrados sem identificação

A batalha da FEB em Monte Castello

AS PRIMEIRAS OFENSIVAS

O general Mascarenhas instalou o seu Quartel General em Porreta-Terme no dia 6 de novembro de 1944. Três dias depois, os soldados brasileiros substituíam a 1ª Divisão Blindada norte-americana que, após meses de luta, retirava-se para o descanso da retaguarda.

No dia 24, o Esquadrão de Reconhecimento e o 3º Batalhão do Regimento de Infantaria da FEB juntavam-se à Task Force 45, norte-americana, para a primeira ofensiva contra Monte Castello. A princípio, a operação foi bem sucedida, chegando, mesmo, alguns elementos da Task Force, a alcançar o cume do Monte Castello, depois de se apoderarem do Monte Belvedere, ao lado. Mas a contraofensiva da 232ª Divisão de Infantaria alemã, que defendia Castello e o monte della Torracia, foi violenta, obrigando os soldados americanos e brasileiros a abandonar suas posições já conquistadas. Somente o monte Belvedere não foi devolvido.

“Fui ferido no primeiro ataque ao Monte Castello, no dia 29 de novembro de 1944. À uma hora da madrugada entramos em posição de base do morro. Recebi ordem para cavar, onde passei a noite. À medida que cavava, o chão ia juntando água, de modo que dormi as poucas horas dentro da água, enrolado na manta.

Ao raiar do dia foi servida uma ração K e ás sete horas da manhã recebemos ordem de avançar pelas encostas do morro, em terreno descoberto. Choviam granadas e projéteis por todos os lados. Fui ferido logo no começo, primeiro nas costas, quando tentava cavar um abrigo. Foi quando uma rajada de metralhadora me atingiu de novo, dois projeteis, um na coxa outro no flanco, perfurando-me o abdômen.

Não podendo mais me mover, virei-me para o lado dos alemães e fiquei protegendo a cabeça com o capacete de aço. Recebi outra bala bem no meio do tórax, que moeu minha placa de identidade. Fiquei ali ao alcance do tiros do inimigos durante todo dia. Ao escurecer cessou o fogo e um padioleiro veio a meu socorro e me fez um curativo. Só ás onze da noite é que veio uma equipe de padioleiros para me transportar para as posições da companhia e dali em um jeep para o posto de socorro do batalhão. Colocaram um aparelho de ferro na coxa esquerda e me levaram para o hospital de Valdibura, depois Pistóia, Livorno e Estados Unidos, onde passei um mês e meio em New Orleans e Charleston. Vim então para Recife e daí para o Rio de Janeiro. Fui operado cinco vezes e meu corpo está cheio de cicatrizes”.

— Soldado Vessio Manelli – da 3ª Cia do 1º RI , natural de Sorocaba – São Paulo)

Mas o segundo ataque a Monte Castello, planejado para o dia 29, apenas quatro dias após o primeiro, não iria, também, ter êxito. Para esse segundo ataque, o comando da Divisão brasileira formou um grupamento constituído do 1º Batalhão do 1º Regimento de Infantaria; do 3º Batalhão do 6º Regimento, já provado na primeira investida; e do 3º Batalhão do 11º Regimento. O grupamento foi colocado sob o comando do general Zenóbio da Costa, comandante da Infantaria Divisionária, que contaria com a cobertura de dois grupos de artilharia brasileiros e, possivelmente, com um grupo de artilharia do 4º Corpo.

Um imprevisto, entretanto, se verificaria, naquela noite do dia 28 de novembro, véspera do segundo ataque a Monte Castello: em inesperado e fulminante contra-ataque, as tropas da 232ª Divisão de Infantaria alemã expulsaram os norte-americanos do Belvedere, tomado quatro dias antes, deixando, assim, descoberto o flanco esquerdo das forças brasileiras. O comando da FEB pensou em adiar o assalto para os dias seguintes, na esperança de que o Belvedere fosse reconquistado, mas isso seria desaconselhável, visto que as tropas já se achavam nas posições das quais iniciariam o ataque.

Às 7 horas da manhã do dia 29 de novembro, tinha início a Segunda ofensiva brasileira contra o Monte Castello. As condições de tempo não podiam ser piores: chuva, céu encoberto, o que dificultou e chegou a impedir a atuação da força aérea; havia também muita lama, o que praticamente anulava ou, pelo menos, reduzia ao mínimo a participação dos tanques e viaturas pesadas. Cerca de uma hora depois de ter iniciado o ataque, as tropas brasileiras foram contidas pelos soldados alemães dos 1.043º, 1.044º e 1.045º Regimentos de Infantaria inimigos.

Assim, no fim da tarde, os dois batalhões brasileiros voltaram às duas posições anteriores, sem que, durante toda a luta, devido às condições de tempo, tivessem podido intervir eficazmente os tanques e os aviões. No dia 5 de dezembro de 1944, chegava ao Quartel General avançado da Divisão brasileira, em Porreta-Terme, a ordem do 4º Corpo americano, ao qual estávamos subordinados:

“Cabe à Divisão de Infantaria Expedicionária capturar e manter a crista do monte della Torracia: Monte Belvedere”.

Significava dizer que Monte Castello, situado no centro da linha Belvedere-Torracia, seria, mais uma vez, objetivo principal da próxima ofensiva brasileira, que teria início no dia 12. Às 6h30 do dia 12 de dezembro de 1944, tinha início o terceiro assalto dos expedicionários brasileiros a Monte Castello. Contra a ofensiva dos brasileiros, voltaram a se conjurar os mesmos fatores negativos que haviam frustrado as tentativas anteriores: o céu fechado aos aviões, o frio intenso, a chuva persistente, o lamaçal escorregadio em que se transformara a terra-de-ninguém, entre Gaggio Montano e Castello, impedindo a progressão dos tanques. Mesmo assim, as vanguardas brasileiras conseguiram chegar além da metade do caminho que levava a Monte Castello. À esquerda, os “pracinhas” conquistaram Zolfo, a apenas 200 metros do cume e, ao centro, chegaram a Abetaia, onde foram detidos por cerrado fogo da artilharia alemã.

Esse terceiro ataque a Castello, mais uma vez rechaçado, provou que os planos táticos para a conquista da posição teriam de ser inteiramente modificados. Era evidente que Monte Castello não poderia ser arrebatado aos alemães apenas com o concurso de algumas unidades da 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (DIE), mas sim com o empenho de toda a divisão brasileira na ofensiva.

Isso se fazia mais presente agora, quando os alemães, alertados pela insistência do comando na conquista de Monte Castello, perceberam que aquela era uma posição que não deveriam entregar. A prova disso é que, após o segundo ataque a Castello, o inimigo tratou de reforçar suas tropas no cume e no lado norte do morro, substituindo os regimentos que o defendiam por unidades novas e descansadas, trazidas da retaguarda.

Estabeleceu-se, então, entre brasileiros e alemães, uma determinação paralela: por parte dos brasileiros, a de que Castello teria de ser conquistado de qualquer maneira; por parte dos alemães, a de que o monte não deveria ser abandonado em hipótese alguma. Enquanto isso, o inverno, que se apresentou como um dos mais rigorosos registrados nos últimos cinquenta anos na região apenina, começou a estender o seu lençol branco por toda a frente italiana.

Na cordilheira, os termômetros baixaram subitamente dez, quinze, e até dezenove graus abaixo de zero. E a neve, que começara a cair antes de 24 de dezembro, já cobria todo o setor onde operavam os nossos soldados. Viram-se, assim, os combatentes brasileiros, diante de um outro inimigo igualmente impiedoso e, para eles, até então desconhecido. Como seria possível aos expedicionários brasileiros, gente dos trópicos, enfrentar o mar branco e gelado que os cercava e os fazia tremer?

Foi, portanto, com alívio, e até mesmo com alegria, que a vanguarda da 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (DIE), estendida por quinze quilômetros, recebeu a notícia de que o comando do 5º Exército norte-americano havia voltado atrás na sua decisão de “chegar a Bolonha antes do Natal”; e que, por conseguinte, ficava suspensa a ofensiva geral planejada para os próximos dias.

A frente italiana entrava em recesso, numa longa trégua branca. Até fevereiro, na frente apascentada pela neve, os transidos homens que a defendiam, limitaram sua guerra dos dois lados, a operações de patrulha e a uma modorrenta vigilância nas trincheiras, nos postos de observação e nas trincheiras avançadas. Durante dois meses e dez dias, o compasso de espera impôs, na frente italiana, o ritmo de guerra, num intervalo que só seria interrompido no dia 19 de fevereiro de 1945, data estabelecida pelo comando do 5º Exército norte-americano para o começo da nova e derradeira ofensiva que levaria as tropas aliadas, e entre elas a FEB, para além do vale do Panaro, além do vale do Pó, até as fronteiras com a França.

O PLANO ENCORE

O plano chamava-se “Encore” (bis/repetição). Nele seriam empregadas todas as forças do 4º Corpo do Exército e seu objetivo seria o de expulsar o inimigo do setor do Reno italiano, e persegui-lo, depois, através do vale do rio Panaro. No Plano Encore, a tarefa dos brasileiros seria, mais uma vez, a de desalojar os alemães de Monte Castello. Agora, no entanto, a tática seria outra, exatamente aquela que o general Mascarenhas de Morais sempre defendera, ou seja, a que partia da premissa de que a poderosa posição alemã, situada no setor mais agressivo e mais íngreme do espinhaço apenino, só poderia ser conquistada se, no seu assalto, fosse empenhada toda a Divisão brasileira. E foi exatamente esse ponto de vista do comandante da FEB que se impôs na reunião prévia dos comandantes do 4º Corpo do Exército.

DEPOIS DO RECESSO

No dia 20 de fevereiro de 1945, as tropas brasileiras se colocaram em posição de combate, com os três regimentos da Divisão prontos para convergir na direção de Monte Castello. À esquerda dessas forças, a 10ª Divisão de Montanha norte-americana. Devia apoderar-se do monte della Torracia, garantindo, assim, o flanco mais vulnerável do setor defendido pelos soldados brasileiros. A FEB, na sua totalidade, seria convocada para o último assalto a Castello, mas coube aos três batalhões do 1º Regimento de Infantaria a missão de avançar sobre Castello, dominá-lo, e, de lá, expulsar os integrantes da 232ª Divisão de Infantaria alemã.

Palavras de Cordeiro de Faria:

“Começamos a atacar às 6 horas da manhã. As tropas em ofensiva constituem o 1º Regimento de Infantaria, o Sampaio. Os seus batalhões avançam na seguinte ordem: o 1º Batalhão, comandado pelo major Olívio Gondim de Uzeda, segue pela esquerda; o 2º Batalhão, comandado pelo major Siseno Sarmento, vai pelo centro; e o 3º Batalhão, comandado pelo tenente-coronel Emílio Rodrigues Franklin, partirá da direita. Nossa intenção é envolver todo o morro e, em coordenação com a ofensiva americana que já conquistou Belvedere, e arrancá-lo das mãos nazistas até o fim da tarde de hoje.”

Os nossos “pracinhas” agachados em grupos aqui e ali iam rastejando em direção ao cume, de onde as terríveis metralhadoras alemãs (conhecidas como “lurdinhas”) atiram, imitando curtas e sinistras gargalhadas. Um de nossos soldados encostou-se num pedaço de muro destruído e apontou sua Thompson para qualquer lugar, lá em cima. Os morteiros alemães rebentavam nas faldas do sul, mas nossa artilharia reiniciou seu canhoneio sistemático e certeiro, como fizera toda a noite. O silvo das granadas passando, elas explodindo lá adiante, numa coroa de fumaça que foi envolvendo o Castello numa aura cinzenta. À esquerda, sobre posições americanas além do Belvedere, cinco ou seis aviões Thunderbolt desciam em picada, rápido, e metralhavam impiedosamente, os nazistas.

Os alemães tentavam impedir a progressão dos brasileiros, insistindo num fogo concentrado de seus morteiros. A conquista de Monte Castello só seria consumada depois que os americanos, que haviam partido de Belvedere, tivessem se apoderado de Torraccia, um pico que, mais atrás, dominava todo o morro sobre o qual avançavam nossos homens. O ataque americano, que começara na noite anterior, estava sendo efetuado por uma Divisão especializada, a 10ª Divisão de Montanha, recentemente chegada àquele setor. Às 10 horas da manhã, os americanos se encontravam além de Menzacona, meio caminho entre Belvedere e Toraccia.

Menzacona havia ficado em poder de um dos batalhões brasileiros, com o qual os americanos haviam feito ligação nos primeiros instantes da ofensiva. Então, o avanço combinado, no lado direito, tomou o seguinte aspecto: os brasileiros deixaram alguns homens em Menzacona e seguiram em direção a Castello, pela esquerda, comandados pelo major Uzeda; os americanos deslocaram-se pela frente, avançando em direção a Toraccia. Às 12h30, o major Uzeda, que avançava pela esquerda, pedia proteção da Artilharia para alcançar um ponto à sua frente, e o general Cordeiro ordenou às baterias: “Cinco rajadas de morteiro sobre a cota 813.” Às 13h55, um dos batalhões avisava que haviam sido avistados reforços alemães que começavam a chegar a Castello.

Do lado direito, o coronel Franklin fora detido com seu 3º Batalhão. O major Uzeda prevenia pelo rádio que iria tentar envolver Castello pela esquerda. Às 14h20, o major Uzeda avisou que ia atacar a cota 920, penúltimo ponto antes da crista de Castello. Pediu mais um tiro ao general Cordeiro, que logo transmitia novas ordens às baterias. O major Uzeda se encontrava precisamente a cinco quilômetros do Posto de Observação, tendo realizado, já, uma progressão de mais de dois quilômetros. Às 15 horas, o major Uzeda já se encontrava firme em 930, mas seu avanço foi detido pelas metralhadoras alemãs. Seu objetivo final será a cota 977, ou seja, o cume do Castello, onde tencionava chegar às 16h30.

Então, ficou combinado que, às 16h20, quando seu batalhão iniciasse o definitivo arranco sobre a crista do Castello, toda a artilharia divisionária concentraria seus fogos sobre as encostas e o cume do monte. Estávamos disparando com canhões 105, 155, e com morteiros. Às 15h30, o major Uzeda informava pelo rádio: “Meus homens estão prontos para atacar”. Lá em cima, na cota 930, os soldados, em formação de ataque, esparsos pelos pequenos vales e depressões, ou deitados no resto da neve que o sol ainda não havia limpado.

Entre 13h30 e 13h50, estabeleceu-se uma relativa calma: somente os morteiros alemães, os aviões de bombardeio que metralhavam as costas de Toraccia e um teco-teco brasileiro (que observava tranquilo e solitário, como um pássaro sem pressa, as posições da artilharia inimiga) continuavam em ação. O ponto mais empolgante de toda a luta do dia 21 teve lugar às 16h20, quando toda a Artilharia Divisionária concentrou seus fogos sobre Castello. Começava a anoitecer.

Negros buracos começaram a aparecer na encosta do Castello, e logo o cume ficava transformado numa espécie de cratera de vulcão em atividade. O major Uzeda avançava, protegido pela fumaça intencional, e nossas metralhadoras também trabalhavam ativamente. Os americanos não haviam conseguido, ainda, tomar Toraccia, o que significava dizer que o avanço brasileiro sobre Castello teria de ser consumado com Toraccia, ponto tão estratégico, ainda nas mãos dos alemães.

Às 17h50, a voz do coronel Franklin chegava forte pelo rádio: “Estou no cume do Castello.” E pedia mais fogos de artilharia sobre pontos em poder do inimigo, além do monte. Mais três minutos, e as baterias estavam canhoneando Caselina, Serra e Bela Vista. Os alemães responderam com morteiros, mas essa reação de nada iria adiantar.

Depois que o ataque a Monte Castello chegou ao fim, às 17h30 do dia 21, o tenente Cleber pôde executar a tarefa específica para a qual fora designado: recolher os cadáveres dos soldados brasileiros, exatamente vinte e seis deles, que haviam tombado em Abetaia, quando do ataque frustrado a Monte Castello, em 12 de dezembro de 1944.

“Passamos toda a manhã recolhendo os cadáveres. Também encontramos alguns alemães mortos, mas seus cadáveres escondiam armadilhas fatais. É que os nazistas defendiam a tese de que um deles, morto, ainda pode matar alguém”. No dia 21, como já foi dito, os brasileiros fincaram pé no cume do Castello; passaram a noite lá em cima, intensamente hostilizados pela artilharia alemã e, pela manhã, começaram a estender suas linhas de comunicação. A 23 de fevereiro, dois dias após a tomada de Monte Castello, o Regimento Sampaio, e o 2º Batalhão do 11º Regimento de Infantaria, receberam a missão de se apoderar da região de La Serra, para desafogar as tropas norte-americanas detidas em La Possione e adjacências.

Fonte: Ministério da Defesa – Governo Federal

O 1º ELO – Esquadrilha de Ligação e Observação Brasileira

As Origens

Criada pelo Ministro da Aeronáutica Joaquim Pedro Salgado Filho, pelo Aviso nº 57, de 20 de julho de 1944, a “Esquadrilha de Ligação e Observação”, mais conhecida como a “1ª ELO”, foi a unidade mirim que passou a servir diretamente à Artilharia Divisionária da FEB, sob o comando do General Oswaldo Cordeiro de Farias. Para seu Comandante foi escolhido o Major Aviador João Afonso Fabrício Belloc.

A unidade da Força Aérea Brasileira, tinha o efetivo composto por:

– 11 oficiais aviadores
– 1 intendente
– 1 suboficial
– 8 sargentos mecânicos de avião
– 2 sargentos de rádio
– 8 soldados auxiliares de manutenção
– 10 aeronaves tipo HL Piper Cub, ou L-4 1H na versão militar.

A Missão

Logotipo da 1ª ELO

A missão recebida pelo Comandante da 1ª ELO, era a de executar voos isolados sobre a terra de ninguém e sobre a própria linha de frente inimiga, em aviões desarmados, tipo HL — Piper Cub, nosso familiar “Teco-Teco”, com o objetivo de fazer observação, reconhecimento aéreo e regulagem de tiro, em proveito da Artilharia Divisionária. Eventualmente, o Estado-Maior da 1ª DIE também solicitava ao Major Belloc missões específicas de reconhecimento, muitas vezes coincidindo com as próprias missões normais da Esquadrilha.

Uma missão de guerra na 1ª ELO tinha a duração média de 1h55m (uma hora e cinquenta e cinco minutos), onde o piloto da FAB e o oficial de artilharia que o acompanhava, como observador, ficavam expostos a Flak alemã leve e pesada, além do perigo de formação de gelo no cone do difusor do carburador, o que, muitas vezes, provocava a parada do motor do pequeno Piper.

Os mecânicos usaram toda a técnica para sanar esta pane. Belloc, diante da deficiência do avião, comunicou ao General Cordeiro de Farias a ocorrência. Estava o prudente Belloc apenas alertando do que poderia acontecer a qualquer momento. O pior não aconteceu.

Quando o gelo se acumulava no cone do difusor do carburador, provocando uma parada parcial do motor, o avião começava a perder altura, atingindo mais ou menos altitudes entre 300 e 600 metros, onde a temperatura mais elevada dissolvia o gelo, e o motor voltava a funcionar normalmente. Tudo recomeçava. A missão tinha que ser cumprida. Houve dois casos de parada total, uma com o Cançado e o Elber (FEB), outra com o Fleming e o Iónio (FEB). Pilotos e observadores nada sofreram. Os aviões tiveram suas avarias recuperadas, após os acidentes, pelos dedicados mecânicos da ELO.

* Artigo adaptado do livro “Senta a Pua”, do Brigadeiro Rui Moreira Lima

No Teatro de Operações

O pessoal chegou a Nápoles, no dia 6 de outubro de 1944. Atravessou o Atlântico no USS General Meigs, junto com o 3º Escalão da FEB, este sob o comando do General-de-Brigada Olympio Falconière da Cunha. A escolta do USS General Meigs foi feita pelos navios Rio Grande do Sul, Memphis, Trumpeteer e Cannon, o primeiro de nossa Marinha de Guerra e os três últimos americanos.

De Nápoles partiram ainda, por via marítima, para Livorno, instalando-se na Quinta Real de San Rossore, próximo a Pisa. Em San Giusto, Pisa, receberam os aviões, os Pipers ou L-4H, adaptados em versão militar. Eram pequenos monomotores de 65cv de potência, asa alta, velocidade de 121km/h e com a capacidade de carga útil de 180kg.

No dia 5 de novembro as equipagens iniciaram o voo de adaptação no próprio campo de San Rossore, um hipódromo transformado em pista de pouso, sendo na ocasião os aviões batizados em cerimônia singela, como singela era aquela esquadrilha que estava engatinhando na frente de combate. Os nomes escolhidos foram os mais variados. Naturalmente cada piloto, junto com os companheiros observadores, puseram os nomes de sua preferência. Havia o Grupo Escola, Brasil, Bandeirante, Santa Therezinha, Timbiras, Ceará, Diogo Júnior e Luly. Nomes para todos os gostos. Em San Rossore começou a surgir o esprit de corps da 1ª ELO.

Operaram durante a campanha nos seguintes campos de pouso, pomposamente chamadas pelos componentes da Esquadrilha de “Nossas Bases”:

28.10.44 a 13.11.44 — Hipódromo de San Rossore (Pisa)
13.11.44 a 10.12.44 — San Giorgio (Pistóia)
10.12.44 a 18.03.45 — Suviana
18.03.45 a 27.04.45 — Porreta Terme (Pista de chapas de aço)
27.04.45 a 04.05.45 — Montecchio Emiglia (Montecchio)
04.05.45 a 09.05.45 — Piacenza
09.05.45 a 12.06.45 — Portalbera
12.06.45 a 16.06.45 — Bergamo

Já nessa época, eram 10 os aviões, sendo o número 1 destinado ao Belloc e o número 2 ao João Torres Leite Soares. Apesar disso, ambos voavam suas missões na aeronave que estivesse disponível no momento. Os números e os nomes não importavam nem para eles nem para os oficiais da ELO.

No final das operações, a 20 de junho, os 10 teco-tecos iniciaram o regresso voando em esquadrilha com um pernoite em Pisa: Em 21 pernoitaram em Roma, chegando a Nápoles no dia 22. Em Nápoles os pilotos deixaram seus pequenos pássaros para serem embarcados para o Brasil. Regressaram a Pisa, juntando-se definitivamente ao grosso do 1º Grupo de Caça. Voltaram às origens, estavam com a FAB outra vez.

A 1ª ELO executou a primeira missão de guerra no dia 12 de novembro de 1944, decolando de San Giorgio, Pistóia, tendo como tripulação o 1º Tenente Aviador João Torres Leite Soares e o observador, 1º Tenente do Exército Oswaldo Mescolin. O avião, um 1-4H-5.

A última missão de guerra foi voada no dia 29 de abril de 1945, no 1-4H-6, pilotado pelo Aspirante Aviador Cornelio Lopes Cançado, tendo como observador o 2º Tenente Iônio Portela Ferreira Alves. Nessa data já estavam operando no campo de Portalbera, o último campo em que a Esquadrilha operou cumprindo missões de guerra.

Em 14 de junho de 1945 foi publicado no Boletim Interno nº 73-A da Artilharia Divisionária do Exército, em pleno Teatro de Operações, o seguinte texto:

“De acordo com a ordem verbal do Exmo. Sr. General-de-Divisão, Comandante da 1ª DIE, é extinta a Esquadrilha de Ligação e Observação. Em consequência, os oficiais aviadores e praças da Aeronáutica deverão se apresentar ao 1º Grupo de Aviação de Caça da FAB com sede na cidade de Pisa…”

O estranho nisso tudo é que a pequena Unidade foi criada por um Aviso do Ministro da Aeronáutica, em 20 de julho de 1944, e extinta por um Boletim da Artilharia Divisionária do Exército! Mas como poderia o Exército extinguir, por um simples Boletim Interno, uma unidade da Aeronáutica? O jeitinho foi dado. Mais tarde tornaram a extinguir o extinto. O Aviso Ministerial nº 75, de 11 de outubro de 1945, assinado pelo Ministro Salgado Filho, ratificou o ato.

A 1ª ELO mereceu do Comandante da FEB, comandantes ingleses e americanos e do próprio General Cordeiro de Farias elogios pela sua atuação na frente da 1ª DIE. Tomou parte ativa em todas as principais ações da nossa FEB: Monte Castello, Belvedere, Della Torracia, Montese, Montebufone, Montello, La Serra, Vignolle, exerceu vigilância eficiente sobre os rios Panaro e Serchio, rio Enza e região sul de Collecchio, quando a 148ª Divisão de Infantaria alemã, sob o comando do General Otto Fretter Pico, rendeu-se incondicionalmente ao 6º RI. O ato de rendição da Grande Unidade inimiga realizou-se em Fornoro di Taro, no dia 29 de abril de 1945.

A FAB – Força Aérea Brasileira

As Origens

Em 20 de janeiro de 1941, foi criado o Ministério da Aeronáutica. O Brasil declarou guerra à Alemanha e Itália no dia 26 de agosto de 1942. O 1º Grupo de Caça nasceu a 18 de dezembro de 1943 e começou a crescer quando foi nomeado seu primeiro comandante, o então Major Aviador Nero Moura.

Não foi fácil esse crescimento. É bom relembrar que em 28 de dezembro de 1943, a Aviação Naval e Militar ainda não estavam fundidas de fato; havia em jogo uma política pequena que, aos poucos, foi sendo superada graças à intervenção direta de oficiais jovens, cujo interesse principal era o de fortalecer a Força Aérea Brasileira.

Nero Moura, Faria Lima e alguns poucos a quem coube a responsabilidade de organizar o Ministério da Aeronáutica, foram os pioneiros dessa batalha. Venceram em virtude da eficiência da equipe responsável e da compreensão da grande maioria dos Aviadores da Marinha e do Exército. Estes colocaram os interesses particulares em segundo plano unindo-se para a criação de um Ministério forte, que pudesse se ombrear aos tradicionais da Marinha e Exército, já existentes. Isto foi conseguido

Antes da designação de Nero Moura para comandante, disputou com ele, a honra da comissão seu companheiro, colega de turma e amigo, José Vicente Faria Lima. Salgado Filho, primeiro Ministro do recém-criado Ministério, teve grande dificuldade em realizar a escolha. Ele era civil e qualquer posição havia que ser bem pesada.

Escolhido Nero Moura, Faria Lima simbolicamente incorporou-se ao Grupo. Como Oficial de Gabinete do Ministro excedeu-se em zelo e trabalho para que nada faltasse à Unidade. Ajudou o companheiro durante o planejamento em todas as etapas: no início, antes da partida de Nero Moura para Orlando, e depois operando na retaguarda, nos estágios de treinamento no Panamá e Estados Unidos e, finalmente, na fase em que o Grupo se engajou no Combate. A qualquer solicitação do Comandante ao Ministério, Faria Lima usava toda a força que tinha junto a Salgado Filho para atendê-lo. Daí a afirmação de que ele se incorporou, simbolicamente ao 1º Grupo de Aviação de Caça.

Investido o Major Nero Moura da função de Comandante do 1º Grupo de Caça, tratou imediatamente de cuidar da Unidade, procurando, dentro dos meios disponíveis na época, que ela crescesse unida, forte e sadia. O primeiro passo dado foi o de recrutar o pessoal que iria formá-lo. Optou pelo critério do voluntariado nas fileiras da FAB. Pilotos e especialistas em todas as categorias, atenderam ao chamado da Pátria. Entre eles, escolheu os seus homens-chave, 16 oficiais e 16 sargentos. Como segunda providência, deu a eles a atribuição e a responsabilidade da seleção dos auxiliares; aos Comandantes de Esquadrilha, a escolha de seus pilotos e, aos outros homens-chave designados para as chefias de manutenção, suprimento, armamento, comunicação, inteligência e serviço médico, a de seus comandados diretos. Assim, o Grupo foi tomando corpo.

Treinamento para a Guerra

Em janeiro de 1944, o Comandante seguiu com 32 homens-chave para Orlando na Flórida EUA, onde iriam fazer um período de treinamento de 60 horas nos caças Curtiss P-40 Flying Tiger e adaptação das normas da US Army Air Force, na Escola de Tática Aérea. Em Março, Nero Moura embarcou com seus companheiros para Aguadulce, Panamá. O pessoal, que tinha vindo do Brasil, já o esperava naquela Base. Nessa ocasião, foi promovido ao posto de Tenente-Coronel Aviador.

Na Base de Aguadulce, o Grupo se constitui em uma unidade tática. Foi ali que nasceu o espírito de corpo do 1º Grupo de Caça. Pilotos e equipagens de apoio se entrosaram de tal modo que, já em abril, a Unidade passou a operar independentemente, tomando parte do complexo Sistema de Defesa Aérea da Zona do Canal do Panamá.

Terminado o treinamento, 110 horas de vôo nos caças Curtiss P-40 Flying Tiger e programas dedicados para os outros postos de trabalho, em Aguadulce, aquele que nasceu A 18 de dezembro de 1943 era quase adulto. Em junho, rumou para os Estados Unidos, onde na Base Aérea de Suffolk, Long lsland, NY, travou conhecimento com o Republic P-47-Thunderbolt, o mais moderno avião de caça da USAAF. O treinamento em Suffolk foi tão duro quanto o de Aguadulce. Concluído o curso, pilotos e equipagens de apoio estavam prontos para entrar em ação.

Era o grupo totalmente adulto agora, apenas, faltava-lhe experiência de guerra. Assim cresceu o 1º Grupo de Aviação de Caça, forte e sadio e, ao desembarcar no Porto de Livorno, Itália, a 06 de outubro de 1944, estava em condições de ser submetido à prova final, “o fogo do combate”.

O Grito de Guerra

Durante a fase de crescimento ganhou o grito de guerra – “Senta a Pua!”. Tudo começou no Panamá. Foi adotado espontaneamente. Nas missões simuladas de combate aéreo interceptação, formaturas, tiro aéreo e terrestre e bombardeio picado, já era usado pelos pilotos. Em terra era linguagem comum entre o pessoal de apoio.

Levado para Suffolk, foi ouvido muitas vezes nos céus de Long lsland, dando motivo pela primeira vez à curiosidade dos companheiros americanos, que ali também se preparavam para a guerra. Explicar-lhes o significado era tarefa complicada. Traduza, você mesmo, o significado de “Senta a Pua!” para um estrangeiro e verá.

Pronto para embarcar para o Teatro de Operações, com o grito de guerra em todas os gargantas, faltava ao Grupo um emblema. Coube ao Capitão Aviador Fortunato Câmara de Oliveira, desenhá-lo. Apareceu, então, pela primeira vez, a figura atlética do Avestruz do 1º Grupo de Caça.

Logotipo das forças Brasileiras

“Senta a Pua!” – Quantas e quantas vezes o grito de guerra do 1º Grupo de Caça foi ouvido nos céus da Itália. Os ex-prisioneiros ao regressarem no final da guerra, dos campos de concentração nazistas, falaram da curiosidade mostrada por seus interrogadores em saber o significado desse grito.

Em 16 de julho de 1945, a Unidade aterrissou, vitoriosamente, no Campo dos Afonsos, Rio de Janeiro. Ao ser recebido pelo Presidente Getúlio Vargas, no próprio Campo dos Afonsos, Nero Moura declarou: “Missão cumprida, Presidente!”. Sim, o 1º Grupo de Caça acabara de cumprir a missão para o qual fora criado!

Esquadrilhas do 1º Grupo de Caça

Ao chegar em Tarquínia, o Grupo de Caça recebeu o nome código pelo qual passaria a ser conhecido em combate, o JAMBOCK, e foi dividido em quatro esquadrilhas. Cada uma delas recebeu uma cor e os aviões receberam uma letra e um número que significavam a que esquadrilha pertenciam e sua hierarquia dentro da esquadrilha. A distribuição ficou assim:

– Vermelha (Esquadrilha A), comandada pelo Cap. Lafayette
– Amarela (Esquadrilha B), comandada pelo Cap. Joel
– Azul (Esquadrilha C), comandada pelo Cap. Fortunato
– Verde (Esquadrilha D), comandada pelo Cap. Lagares

O Comandante Nero Moura e o Subcomandante Pamplona ficaram com os aviões nº 1 e nº 2, respectivamente.

Em fevereiro de 1945, a esquadrilha Amarela deixou de existir devido ao pouco número de pilotos restantes. Nada menos que seis dos onze pilotos estavam impossibilitados de combater. Dois haviam morrido (Sapucaia e Medeiros), três haviam sido abatidos (Motta Paes, Joel e Brandini) e um estava baixado no hospital (Ismar). Os pilotos que restaram (Pessoa Ramos, Dornelles, Lara, Rocha e Canário), foram distribuídos pelas outras esquadrilhas.

Durante o trabalho de pesquisa não conseguimos correlacionar alguns números de série com a designação da Esquadrilha. O trabalho de pesquisa continua, mas até lá eles ficarão na classe de Indeterminados.

Leia um artigo sobre a FAB

Brasileiros no outro lado?

Encontrar dados dos pilotos brasileiros que lutaram na Segunda Guerra Mundial não é fácil. Ainda mais tentando descobrir se algum deles lutou do lado alemão.

Poucos sabem, mas um brasileiro se tornou o Ás da Luftwaffe, a Força Aérea Alemã.

Difícil de acreditar, mas essa é a história de Egon Albrecht Lemke, natural de Curitiba, Paraná, descendente de alemães.

Atendendo ao chamado de Hitler, Egon viajou para a Alemanha nos anos 30, se juntou à juventude hitlerista e, mais tarde, com pouco mais de 20 anos de idade, tornou-se um dos mais destacados pilotos de caça alemães, participando de dezenas de missões de ataque na Europa.

Egon Albrecht com suas condecorações: À esquerda, abaixo da Águia da Luftwaffe a Deutsches Kreuz im Gold (Cruz Alemã em Ouro). Ao centro no pescoço, a Ritterkreuz (Cruz de Cavaleiro) e logo abaixo da lapela duas fitas. A primeira refere-se à Eisenerskreuz (Cruz de Ferro) 2ª Classe, a segunda à Medaille Winterschlacht im Osten 1941/2 ( Medalha da Batalha de Inverno no Leste 1941/2) também conhecida como Ostfrontmedaille (Medalha da Frente Oriental). Era popularmente chamada de Gefrierfleisch Orden (Ordem da Carne Congelada). À direita, de cima para baixo temos a Frontflugspange für Schlachtflieger und Zerstörer (condecoração por número de missões de combate), Goldenes HJ-Abzeichen (em forma de losango), Eisenerskreuz (Cruz de Ferro) 1ª classe e abaixo dela, à esquerda, a Verwundetenabzeichen (condecoração por ferimentos em combate. Pela coloração na fotografia pode ser a de prata – até quatro ferimentos – ou de ouro – acima de 5 ferimentos) e ao seu lado o brevê de piloto.

Já se sabe que ele nascera em 19 de maio de 1918 em Curitiba, no Paraná. Analisando os diversos cartórios de registros em Curitiba, com grande surpresa, foi descoberto que duas crianças nasceram neste mesmo dia, ambas registradas Egon! Uma, batizada Egon Alberto Kummrow, filho de Guilherme e Cecília Kummrow. A outra, Egon Friedrich Kurt, filho de Frederico Albrecht e Hedwig Elditt Albrecht. Contatos mantidos com o Deutsche Dienstelle (WAST) adicionaram poucas informações sobre Egon, eles não tinham em seus registros o nome de seus parentes.

Qual deles seria então o piloto procurado? Finalmente uma luz se acendeu, quando foi confirmado que o local de nascimento constava como Portão/Curitiba. Portão é um distrito da Cidade de Curitiba, assim sobrava apenas Egon Friedrich Kurt, o único registrado no cartório de Portão.

Inicialmente acreditava-se que Egon Alberto Kummrow pudesse ter “germanizado” seu nome para Egon Albrecht. O que de fato parece ter ocorrido é que Egon Friedrich Kurt passou a usar o nome de família de seus pais, Egon Albrecht.

Mas ainda fica uma dúvida: sendo seus pais Albrecht, por que fora registrado como Egon Friedrich Kurt?

Adoção? Filho de outro parente? Como teria ele então chegado até a Luftwaffe?

Estas perguntas provavelmente nunca serão respondidas. Teria ele aprendido a voar no Brasil ou ido ainda jovem para a Alemanha e feito seu treinamento por lá?

Egon Albrecht, primeiro à direita, observa uma conversação entre Adolf Galland e Walter Krupinski.

As informações constantes do livro “Die Ritterkreuzerträger der Luftwaffe 1939-1945” volume 1, são:

“Hauptmann Egon Albrecht. Pertencia ao 6/ZG 1 (depois 9/ZG76) desde 1940. Neste Staffel, (depois renomeado 6/SKG 210 e depois novamente 6/ZG1 em 1 de janeiro de 1942), lutou na Rússia a partir de novembro de 1941, tornando-se seu Staffelkapitän em 12 de junho de 1942.

Foi agraciado com a Cruz de Cavaleiro após 15 vitórias aéreas e seu impressionante sucesso contra alvos terrestres. Em cerca de 250 missões de combate foi creditado com a destruição de 11 aviões no solo, 162 veículos motorizados, 254 veículos puxados à cavalo, 3 locomotivas, 8 canhões anti-aéreos, 12 canhões anti-tanque, 10 canhões de campanha e 8 posições de infantarias (bunkers).

Após a transferência do Gruppe para o setor da França Ocidental ao final de julho de 1943, tornou-se Kommandeur do II/ZG 1 em 9 de outubro deste mesmo ano, comandando com grande sucesso o Gruppe na França, assim como na defesa do Reich.

Esta unidade foi reorganizada como um Grupo de Caça em julho de 1944, sendo transferida para a Normandia, combatendo a invasão aliada como III/JG 76. Devido à um problema de motor, foi forçado a abortar de uma missão de combate no dia 25 de agosto de 1944, e no voo de volta foi pego por uma formação de caças americanos. Estava retornando para a base sozinho e não teve a mínima chance. Seu aparelho, um Messerschmitt Bf-109 G-14 W. Nr. 460593, ‘Preto’ 21, foi derrubado próximo a St. Claude, noroeste da cidade de Creil.

Ele saltou de paraquedas mas chegou morto ao solo (teria sido mortalmente atingido ainda no avião ou foi atingido durante a descida no paraquedas, o que não era incomum… – Nota do Autor). Ao chegar ao solo, seu corpo foi saqueado por civis. Contava então com cerca de 25 vitórias aéreas, sendo 15 delas no front Russo e 5 bombardeiros quadrimotores”.

Egon Albrecht primeiro à esquerda na segunda fileira, durante um encontro do I Jagdkorps

Seu falecimento foi oficialmente registrado pelo Ofício de Registro em Spandau em 7 de fevereiro de 1945 sob o número 398/45. Na primeira edição do livro acima citado, era mencionado que fora abatido por “Mustangs”. Entre suas condecorações estavam o Ehrenpokal a 21 de setembro de 1942, Deutschen Kreuz im Gold a 21 de dezembro de 1942 e a Ritterkreuz zum Eiseners Kreuz a 22 de maio de 1943.

A lápide de Egon Albrecht. Cortesia da imagem: Via Werner Farwick

Discussões subsequentes nas revistas da Luftwaffe Verband não puderam identificar claramente a qual unidade americana pode ser creditada a sua morte. Entre as prováveis unidades estão o 355th. E 356th. Fighter Squadrons do 354th. Fighter Group, o 367th. Fighter Group (operando P-38) e o 15th. Tactical Reconnaissance Squadron. Não existem registros de vitórias neste dia para os “Mustangs” da RAF na França.

Outro fato muito interessante é a condecoração que Egon Albrech recebeu da Hitler Jugend. Ela chama-se “Goldenes HJ-Abzeichen”. Esta decoração foi dada apenas aos jovens entre 14 e 18 anos que pertenciam à HJ antes de 30 de junho de 1933, ou aos membros honorários do alto escalão do NSDAP, como Göring e Himmler. Esta mesma condecoração também agraciou os integrantes da “Auslands-HJ” (as HJ no estrangeiro).Até a presente data, em pesquisas realizadas nos arquivos da HJ na Alemanha, não foi possível descobrir os registros dos agraciados com esta condecoração. Acredito que seria possível saber se Egon Albrech estava no Brasil ou Alemanha ao ser condecorado.

Uma rara fotografia que mostra um Messerschmitt Bf 109 G-10 do III/JG 76, em Metz-Frescaty, França, setembro de 1944. Podemos ver claramente o número 8 e a barra vertical (3º Gruppe), ambos em preto. O Bf 109 G-14 que Egon pilotava, foi produzido na Erla-Leipzig, sendo um aparelho novo.
Front Russo, inverno de 1942, alguns Me-110 do 4/ZG1 preparando-se para mais uma missão. No dia 19 de dezembro deste mesmo ano, Egon Albrecht caiu com seu avião, pertencente ao 4º Staffel, em Krasnodar, devido ao mau tempo. Egon, então Tenente, com o restante da equipagem, Unteroffizier Kurt Urban (operador de rádio) e Feldwebel Hans Steckmann (metralhador), nada sofreram. A identificação deste avião ainda é confusa. Teria sido um Messerschmitt Bf 110 C-4 sofrendo danos de 45% mas também existe a informação de que seria um Messerschmitt Bf 110 D-3 W.Nr. 3666 cujos danos chegaram à 80% do aparelho. Cortesia da imagem: John Vasco.
Esse perfil, criado por Fernando Estanislau, representa como possivelmente seria o Messerschmitt Bf-109G-14 pilotado por Albrecht durante a Guerra

O Bundesarchiv em Berlim, encontrou em seus arquivos a ficha de inscrição de Egon Albrecht no NSDAP. Foi efetivada em 1º de maio de 1937 sob número 5084707. O Bundesarchiv informou que será difícil localizar dados referentes à HJ pois praticamente tudo foi destruído durante a guerra. Outra grande surpresa está gravado acima, na foto da lápide. Seu nome está registrado como Egon Albrecht Lemke! Apenas na lápide consta o nome Lemke. Qual seria o significado? Casamento talvez? Mais mistérios…

DataHoraTipo de aviãoUnidadeLocalização
04/07/194216:18Yak-11./ZG 18126
04/07/194216:27Yak-11./ZG 18123
05/11/194208:25I-16II./ZG 144 853
22/02/194412:50B-24Stab II./ZG 1S Pilsen
23/02/194412:02B-24Stab II./ZG 1S Wels
25/02/194413:11B-24Stab II./ZG 140km NNW Brück
12/04/194412:13B-24Stab II./ZG 1E Wiener Neustadt
26/06/194409:32B-24Stab II./ZG 1NW Pressburg

4 comentários em “A participação do Brasil na guerra”

  1. Egon Alberto Kummrow é meu avô! Havia um manuscrito contando a história da família, mas infelizmente sumiu!

  2. Meu pai, Roldão Pires, foi pracinha e participou da tomada de Montecastelo.
    Lembro que ele adorava contas tudo o que viveu lá.
    Voltou com sequelas e morreu jovem.( 53 anos).
    Os pracinhas não foram devidamente valorizados. Colocaram suas vidas à disposição da Pátria e muitos passaram por muitas dificuldades depois da guerra.

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